Muita gente percebeu um aumento nas compras durante a quarentena, com a ausência do prazer que a gente encontrava indo em festas, eventos e viagens, e por me incluir nisso e ver isso no comportamento de compras das minhas clientes na consultoria de estilo, resolvi falar sobre a relação da compra e a felicidade.
Terapia das compras
Esses dias eu compartilhei no instagram o post de uma personal shopper que classifica o nível de estresse nas brigas de casal e sugere um valor para as compras em cada nível, para “afogar as mágoas no cartão de crédito e evitar problemas maiores”. Oi???
Tem tanto absurdo nessa ideia, que renderia um livro, mas vou tentar falar apenas sobre o tema desse texto, que é o fato de que o ato de comprar gera prazer. Ao comprar, o corpo recebe uma carga de dopamina, que é um dos hormônios da felicidade, e por isso é comum as pessoas comprarem mais quando estão tristes ou com algum problema – que geralmente não vai ser resolvido com aquela compra.
Isso significa que, ao brigar com o seu marido e comprar uma bolsa cara de marca, isso não resolve o problema e nem vai evitar novas brigas. Mesmo que ele seja o responsável pelo pagamento, ou que você compre no cartão de crédito dele. ele só estará pagando pela bolsa e não pelo erro que ele cometeu (e aqui eu estou considerando que ele é o único errado na briga também e que a compra seja uma forma de você se sentir recompensada ou vingada pelo mal que ele fez).
Mais adiante no texto eu vou falar sobre o termo “dopamine dressing”, que está sendo usado para falar sobre a forma de se vestir pós coronavírus.
A privação do prazer na quarentena
Durante a quarentena, muitas pessoas compravam coisas que não usariam tão cedo de novo (como salto alto, roupa de balada ou de trabalho, etc.) pelo prazer de comprar, ou seja, uma situação onde a compra em si vale mais do que usar o item.
Isso acontece porque fomos privados de várias outras fontes de prazer – e comprar continuou sendo possível, já que a gente pode comprar online e receber os itens no conforto da nossa casa, o que ajudou a manter a relação entre a compra e a felicidade.
Isso é mais comum do que a gente imagina, e tá longe de ser uma coisa que acontece apenas no mundo da moda e eu posso te provar: Me fala quantos livros tem na sua estante que você ainda não leu! Quantos livros você comprou pelo prazer de comprar e ter na estante e não pelo prazer que a leitura ia proporcionar?
O que essas situações têm em comum é a busca por uma recompensa emocional, e eu percebi acontecer comigo com a comida (agora um pouco mais que no começo do quarentena), o que me chamou a atenção porque eu nunca fui uma pessoa que “descontasse” na comida em momentos de estresse.
No meu caso, eu não aumentei a quantidade de comida, mas estou comprando com mais frequência pelo aplicativo, gastando mais com lanches e pedindo em restaurantes mais caros que o normal, com aquele argumento que todo mundo conhece: “eu mereço!”.
E aí, ao liberar dopamina no corpo e sentir prazer ao comprar, o cérebro registra isso e sabe exatamente o que pedir quando precisa de prazer de novo: que você repita o que fez pra ter prazer naquela situação anterior.
Eu já falei um pouco sobre a influência da pandemia do coronavírus no comportamento de consumo, e vale a pena ler esse texto do ano passado para entender melhor como esses eventos podem mudar a nossa forma de comprar.
Além da dopamina, outros ciclos hormonais podem explicar essas compras impulsivas, e vale a pena observar se é o que acontece com você.
Os hormônios interferem nas nossas decisões de compra
As mulheres têm um ciclo hormonal que varia bastante durante o mês, e pesquisas falam da relação de duas partes do ciclo com as compras impulsivas:
- A TPM “desliga” o botão do bom senso na mulher. O ciclo menstrual libera uma série de hormônios que atuam sobre o córtex orbitofrontal, que tem a função de barrar as decisões impensadas. Na TPM, essa função fica comprometida e a mulher fica mais ansiosa, o que pode fazer com que ela faça compras por impulso.
- O estradiol, que é um hormônio fabricado principalmente nos ovários, deixa a mulher com o comportamento mais sedutor, e por isso, durante a ovulação, ela tende a comprar roupas mais sensuais e itens de beleza como maquiagem, por exemplo, porque, mesmo que inconscientemente, nessa época ela quer se mostrar mais atraente, aumentando suas chances de acasalamento.
E falando em maquiagem, vale a pena citar que a venda de maquiagens também aumentou no começo da quarentena (mesmo com o uso de máscaras sendo obrigatório). As pesquisas indicam que aqui no Brasil, as pessoas associam a beleza ao bem estar, e por isso teve aumento das vendas desses itens.
Num texto que eu fiz bem no comecinho da quarentena eu falei sobre como comprar bem pela internet, e tem algumas dicas que ajudam a evitar as compras por impulso. Vale a pena ler também!
Freud explica
De novo, aqui, vemos que a compra está mais associada ao prazer do que ao uso do objeto comprado. Na faculdade de psicologia eu aprendi que isso é o que a psicanálise chama de a angústia do desejo, que nunca acaba, mesmo depois que conseguimos saciar aquele desejo específico, porque a angústia está no ato de desejar.
A gente compra, sente uma sensação de prazer pelo desejo saciado, e em seguida sente angústia de novo e compra de novo, porque, segundo Freud, o desejo não pode ser saciado e a gente só deseja o que não possui… entende como o ciclo funciona?
Tem um vídeo de um professor de yoga que explica esse mecanismo de relação entre a compra e a felicidade de forma mais engraçada e rápida:
Espero que tenha dado pra entender, porque esse assunto é complexo demais pra tratar inteiro nesse texto, que é mais amplo e já está enorme.