No dia 28 de junho a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que acaba com a isenção de impostos nas compras internacionais de até U$50, ou seja, como o presidente Lula já aprovou o fim da isenção de impostos no dia 27, se for aprovado pelo Senado Federal, vai ter a taxação das compras que custem até R$268 pela cotação atual do dólar, a partir de 1º de agosto.
A taxação das compras na Shein (e em outros sites chineses, como a Shopee e a Aliexpress, por exemplo) também está sendo chamada de “taxa das blusinhas”, e foi uma medida solicitada pelo setor varejista nacional (Luciano Hang e Luiza Trajano estão entre eles), argumentando que a isenção favorecia empresas estrangeiras injustamente, prejudicando a concorrência e as empresas brasileiras.
O que eu penso sobre a taxação das compras na Shein?
Eu sou consultora de estilo desde 2014 e se você não conhece o meu trabalho e caiu nesse texto de paraquedas, é importante saber que eu defendo muito o consumo consciente, as marcas nacionais e pequenas, e já falei mal da Shein em vários textos aqui no site e lá no meu instagram, mas algumas coisas mudaram na minha forma de pensar sobre isso, e por isso quis falar sobre o assunto aqui também, e deixar isso registrado.
Eu não indico a Shein para minhas clientes
Com ou sem a taxação, eu não indico a Shein para minhas clientes, porque além de todo o histórico com trabalho análogo à escravidão que eu contei nesse outro texto, as peças não tem muita qualidade.
Aliás, uma coisa não existe sem a outra, né? As roupas da Shein só conseguem ser baratas por causa da baixa qualidade das peças e do salário baixo que é pago aos seus funcionários. As pessoas costumam questionar como pode uma regata de malha da Prada custar quase R$6 mil mas não se pergunta como pode um blazer da Shein custar menos de R$100,00.
É claro que são duas empresas com públicos completamente diferentes, e a pessoa que tem R$6 mil pra comprar uma regata da Prada não vai ser a pessoa mais afetada com a taxação das compras na Shein, e sim os mais pobres, que compram 3 blusinhas por R$100. E é aqui que esse projeto me incomoda.
A Shein é a única opção para muitas pessoas
Num dos primeiros textos que eu escrevi aqui no site eu falei o que penso ser consumo consciente de verdade: Não adianta a pessoa ser contra as fast fashion e querer fazer a sua parte para salvar o Planeta (ou a economia do Brasil) se não tem dinheiro para comprar de marcas autorais.
Mas, entre não poder pagar R$300 numa blusa de uma marca nacional, mas a cada 2 meses renovar o seu estoque de blusinhas de R$27 porque já estão gastas, com bolinha, esgarçada (ou qualquer outro problema que acontece por conta da baixa qualidade das peças) tem uma diferença muito grande. As pessoas precisam entender o impacto dessas compras, e saber que ainda que a indústria da moda seja a maior culpada disso tudo, nós também temos a nossa parcela de responsabilidade. Você já viu como está o deserto do Atacama, com tanto resíduo têxtil (roupa jogada fora)? Olha ele, visto do espaço:
A Shopee só vende a regata da Prada falsificada porque tem quem compre. E essas pessoas pagam até mais caro que uma regata da Shein, por exemplo, só pra parecer ter comprado uma regata que custa R$6 mil. Eu já contei nesse outro texto que sou contra comprar artigos de luxo falsificados, e que essa necessidade de se sentir incluída / pertencente a um grupo de pessoas faz com que a gente compre mais do que precisa – e mais do que o Planeta suporta.
Ao mesmo tempo, eu também já indiquei aqui onde comprar camisa de time de futebol na Shopee, que também são falsificadas. Camisa de time também não é necessidade básica, né? E os times lançam pelo menos duas camisas novas por ano, com preços que podem chegar a meio salário mínimo. Pra quem gosta de futebol, essa pode ser a única forma de comprar a camisa do seu time do coração sem prejudicar muito o seu orçamento doméstico.
Percebe que eu “defendo” os dois lados, e por isso não sei dizer se concordo ou não com a taxação das compras na Shein? A moda é elitista, e as fast fashion apareceram justamente para dar acesso à moda para quem não tem grana pra comprar em grifes e outras marcas. Mas, antes uma coleção durava 3 meses nas lojas, e hoje esse fluxo é muito maior! Eu que estou sempre em shoppings com as minhas clientes não vejo a mesma vitrine e nem as mesmas peças em semanas consecutivas. Se eu indicar uma peça pra alguma cliente num dia, pode ser que ela não encontre mais na loja em poucos dias.
Quando a gente pensa em pessoas gordas (mulheres e homens) a questão é a mesma: como a moda plus size é ainda bem problemática (seja por conta dos tamanhos, da modelagem, dos preconceitos ou dos preços), a Shein é uma oportunidade de acesso à moda, oferecendo mais opções e poder de escolha.
Sabe aquela música que diz que “a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”? Pois é. Eu não acho que o pobre tem que ter acesso apenas ao que é extremamente necessário, enquanto quem tem grana sobrando pode pagar R$6 mil numa regata de malha – muito pelo contrário! Eu acho que todo mundo deveria poder comprar o que gosta e/ou precisa, e nem é porque eu trabalho com moda. Eu só acho injusto mesmo!
E quer saber? O Lula também acha, e tentou segurar essa aprovação até quando pôde, mas ele não pode fazer tudo sozinho e eu não sou ingênua de achar que o “véio da Havan” só percebeu que isso estava prejudicando o Brasil agora, depois de 2 anos de governo da esquerda, né?
Conclusão
Já escrevi quase 1000 palavras e não cheguei a uma conclusão sobre a taxação das compras na Shein. Ao mesmo tempo que eu acho esse tipo de produção de roupa muito errada e queria que não existisse (não nesse formato), eu sei que as pessoas que trabalham nessas fábricas dependem desses empregos, e que muitas pessoas ficariam sem poder comprar itens de moda e se sentirem parte de uma sociedade que valoriza o “ter” mais do que o “ser”.
Será que existe uma maneira de compensar a moda brasileira de alguma forma, para que os seus preços fiquem mais baixos, a ponto de poder virar uma opção para as pessoas que compram nessas ultra-fast fashion por falta de opção e não porque gostam?
Eu já contei aqui que eu compro muito em brechó e indico muito comprar roupas usadas para as minhas clientes da consultoria de estilo que gostam de marcas mais caras, mas até o brechó tá deixando de ser uma forma de consumo consciente, com tanta gente fazendo vídeos de “achadinhos” e “garimpos” todos os dias… o que me faz lembrar que só não taxar não é o suficiente pra mudar a forma de consumo das pessoas. Alguém sabe a resposta certa?